quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Não ele

 



Maputo, 12 de novembro de 1950


Querida Avó, 


Estou a conseguir o que sempre me propus e a cada dia que passa chego mais perto do que sonhei para mim e para a minha vida. Há tanto tempo que não sonho contigo nem te sinto por perto.
 A mãe já não será operada e o padre João está a recuperar. 

Sinto, de alguma forma, que quase perdi mas não o encontrei mais. Não sei explicar esta sensação melhor do que isto: de perder alguém, de se encontrar mas não ser mais o que foi. 

Não evito as lágrimas quando o oiço dizer o meu nome com uma língua enrolada e com os olhos cheios de água num desespero de lobo. O choro do nosso padre ao telefone é assim e eu oiço sentada do outro lado a chorar como se o quisesse agarrar sem conseguir.

Eu sei que ele vive naquele corpo, eu sei que ele percebe o que aconteceu.

Gostava de pedir-te que falasses com Deus sobre ele e lhe dissesses o quão importante ele é para o mundo. Tão mais do que eu. Tão mais do que tanta gente.
Ajuda-me nisto, avó. 

Não ele. Não ele.

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Entrevista - Alentejo Calling - Rádio Renascença

  ler aqui:  https://rr.sapo.pt/noticia/pais/2024/09/24/migrantes-ajudam-a-construir-um-alentejo-absolutamente-novo-e-povoado/394895/