Vou deixar que me ponhas os ossos partidos no sítio; vou deixar que apanhes o que sobra do meu corpo do chão.
Vou deixar que cuides de mim, que me cosas as feridas, que unas a minha pele com agrafos: vou deixar que me agrafes os cortes profundos com os maiores ou me dês pontos interiores; e não vou chorar.
Vou deixar que me deites na tua cama e me limpes as marcas sem estar atenta ao perigo
( na tua casa o perigo é um homem alto que fica à porta: tu nunca deixas o perigo tocar-me)
Vou virar-me de barriga para baixo para veres o estrago nas minhas costelas enquanto sei que abanas a cabeça e lamentas a minha dor.
Vou deixar que com uma tesoura me cortes a roupa para me tratar nua, e vou ficar de olhos fechados em repouso, porque em ti eu sempre pude sossegar.
Vou deixar que me ponhas as ligaduras nos pulsos deslocados, nas costas massacradas, a pomada nas nódoas negras das pernas e nas ancas em círculos de massagem com as pontas dos teus dedos - sempre - tão amorosos e salvificos.
Vou deixar que arrumes o quarto de hóspedes da tua casa para mim, que me abras as malas e me ponhas a roupa no armário para não se amachucar.
Vou aceitar que cozinhes e me leves comida à boca.
Vou aceitar não fazer esforços até que os meus dedos escrevam
(eu sei que gostas de ouvir a velocidade dos meus dedos nas teclas e a luz do meu quarto acesa as 3 da manhã)
Sei que sorris quando eu escrevo.
Vou aceitar ficar.
Porque tu és guarda.
Porque és abrigo.
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