terça-feira, 11 de setembro de 2012

03:03


 
 
 
 

Há 3 noites que não durmo. Os olhos não fecham, oiço vozes na cabeça desde as 03:03. Levanto-me para depilar os ossos antes de me sentar na sanita
e fazer água usada sair do meu corpo pela vagina. Há 3 noites que não durmo. Os olhos fecham e entrelaçam as pestanas.
Vejo o meu perfil de olhos fechados como se me visse de fora: as vozes dizem que eu durmo assim e eu acredito. As vozes na cabeça fazem-me acreditar. Aqui em casa ninguém cospe para o chão antes das 09:04 porque ninguém se levanta antes das 09:04. Não há um horário certo de pequeno-almoço porque cada um de nós come apartado, agarrado ao seu prato de sopa com leite, papas e pão. Há 3 noites que não durmo. Na minha casa todas as meninas nasceram com pernas tortas à laia de troncos de árvore mirrados onde o arbusto é a nossa boca. Temos ramos a saírem-nos pela boca.
E folhas verdes entre os dentes. Há 3 noites que não durmo.

Entrevista - Alentejo Calling - Rádio Renascença

  ler aqui:  https://rr.sapo.pt/noticia/pais/2024/09/24/migrantes-ajudam-a-construir-um-alentejo-absolutamente-novo-e-povoado/394895/