quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Não ele

 



Maputo, 12 de novembro de 1950


Querida Avó, 


Estou a conseguir o que sempre me propus e a cada dia que passa chego mais perto do que sonhei para mim e para a minha vida. Há tanto tempo que não sonho contigo nem te sinto por perto.
 A mãe já não será operada e o padre João está a recuperar. 

Sinto, de alguma forma, que quase perdi mas não o encontrei mais. Não sei explicar esta sensação melhor do que isto: de perder alguém, de se encontrar mas não ser mais o que foi. 

Não evito as lágrimas quando o oiço dizer o meu nome com uma língua enrolada e com os olhos cheios de água num desespero de lobo. O choro do nosso padre ao telefone é assim e eu oiço sentada do outro lado a chorar como se o quisesse agarrar sem conseguir.

Eu sei que ele vive naquele corpo, eu sei que ele percebe o que aconteceu.

Gostava de pedir-te que falasses com Deus sobre ele e lhe dissesses o quão importante ele é para o mundo. Tão mais do que eu. Tão mais do que tanta gente.
Ajuda-me nisto, avó. 

Não ele. Não ele.

terça-feira, 10 de novembro de 2020

kintsugi

 


kintsugi
arte japonesa de reparar algo quebrado com ouro, prata ou platina aumentando a sua beleza.




quinta-feira, 22 de outubro de 2020

sempre

 


Um dia gostava de fazer um poema sobre a nossa amizade e sobre o que representa para mim, mas não sei se algum dia teria sabedoria para isso.
No dia em que nos tiraram esta fotografia, estávamos felizes. Também estávamos desfocados, mas estávamos muito felizes. Agora só posso viver a nossa amizade lembrando-o a si por que é que um dia me escolheu como amiga e porque um dia tive direito à sua amizade e admiração.

Ninguém disse que isto da amizade de verdade era terreno fácil e, de facto, não tenciono viver sem si

na minha vida.

segunda-feira, 31 de agosto de 2020

"O último exorcista de Lisboa" - TOP 10 da Guerra&Paz

 


Já é oficial. De 5.ª a domingo, este foi o melhor arranque de sempre de uma Feira do Livro na Guerra e Paz editores. São estes os 15 livros mais procurados pelos leitores, o nosso top 15.

1. Este vírus que nos enlouquece
2. Observação da gravidade
3. O ouriço e a raposa
4. Mein Kampf-a minha luta
5. A arte da guerra
6. Contos tradicionais portugueses
7. Atlas histórico de África
8. Assim nasceu uma língua


9. O último exorcista de Lisboa


10. Mulherzinhas
11. Moby Dick
12. Orgulho e preconceito
13. Boas esposas
14. A segunda vida de Fernando Pessoa
15. O pequeno livro vermelho





sexta-feira, 21 de agosto de 2020

"O último exorcista de Lisboa" - conversa na Feira do livro - 17h00 - 30 de agosto

 Vou estar à conversa na Feira do Livro de Lisboa , dia 30 de agosto pelas 17:00!

O tema será o meu último livro “ O último exorcista de Lisboa” . Conto com todos! ❤️


Feira do Livro de Lisboa - Apresentação do livro "O menino que não via o sol" - 5 de setembro (16h15 )



Estamos a apresentar o livro “o menino que não via o sol” dia 5 de setembro pelas 16h15 , no auditório poente da Feira do livro de Lisboa. Este é o primeiro livro dirigido a crianças que aborda temas tão importantes como a mutilação genital, a vacinação, casamentos precoces e a integração . Conto com todos! ❤️

segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Das palavras do mundo

 

Em alemão não existe a palavra grávida. Existe a concepção dessa condição que para os alemães significa "trazer uma criança debaixo do coração" - ein kind unter dem herzen tragen"

sexta-feira, 7 de agosto de 2020

Do Tempo

 

17 de julho de 1897




A V. escreveu-me a dizer que passou o mesmo que eu. Que percebe.

Não sei se ela se sentou como eu, na cama, com um vazio imenso dentro dela. 

Eu nunca quis que chamassem ninguém mas precisei de ouvir a voz da minha irmã para que, de alguma forma, pudesse perceber que eu própria tinha de saber-me viva. De alguma forma, curiosamente, é sempre ela.

Isto não era bem só um vazio, era uma espécie de vazio gelado de um inverno rigoroso que queima tudo à sua volta. 


Também não sei se os médicos dela foram tão generosos como aqueles que eu encontrei a olhar por cima de mim, enquanto eu chorava sem saber como não parecer tão vulnerável - tão frágil como nunca quis ser. 

Afogo-me em trabalho porque o trabalho redime e salva e, de alguma forma, apesar de tanto amor que recebo, sei que preciso de ser salva, e esse trabalho de casa também é meu.



quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Do eterno



Querida S.,


Não andei agarrada a fotos tuas depois da tua morte. Enterramos-te. 

Vieste a falecer um dia depois de eu celebrar um mês de casamento, um dia antes de eu te ter tentado visitar-te.
Fiquei parada na tua entrada, como se o cimento fosse a eterna continuação das minhas pernas e dos meus pés quando o teu irmão me disse que estavas a ter um dia mau.
De facto, ele não disse um dia mau, disse um dia muito muito mau.

Eu não ouvi nem vi o que ele já me dizia com a boca e com o olhar.

Recordo a tua voz e o nosso passado de teenagers nos escuteiros e isso basta-me. Ouvir-te cantar.
É àquela Sónia que eu vou quando quero recordar. 


Vi os teus filhos nesse dia, não faço ideia como sobreviverão sem ti.

Acredito, ainda assim, que terão na memória uma mãe que aguentou o impossível por eles, e com a sabedoria que a vida nos traz, aprendi que é sempre o melhor que fica quando o pior nunca foi terror.

Eu desembaracei a minha dor e estou bem.

(eric lacombe)

domingo, 26 de julho de 2020

Qual é a minha terra?


Madrepérola



15 de julho de 1887



meu querido filho,

a tua morte ainda na minha barriga foi o maior desespero que senti até hoje, e de alguma forma, amar-te, a minha maior alegria.

Acredito que uma mãe nasce quando nasce o seu bebé, mas no nosso caso, pelo amor que já te tinha, tudo foi diferente.

Desejei-te incansavelmente.

Escolhi para ti o pai perfeito que acredito ter-te amado de igual forma. O seu coração padeceu tanto como o meu, mas o nosso agradecimento por nos teres escolhido a nós, tornou-se a nossa madrepérola.

Queria que soubesses isso pela escrita.

Porque ela, como tu, é eterna.






quarta-feira, 24 de junho de 2020

"O menino que não via o sol" - livro infantil



"O menino que não via o sol" é um livro infantil que aborda temas tão sensíveis como a Diferença, a infância, o respeito pelo outro, a mutilação genital, casamentos precoces e a vacinação.
A história de Mussa é inspirada na tradição guineense e acho que não podia estar mais feliz com o meu 6º filho.

Deixo-vos um cheirinho deste livro que vai invadir escolas, colégios e bibliotecas.

A apresentação decorrerá em Lisboa, em breve, com todas as medidas de segurança necessárias.



segunda-feira, 8 de junho de 2020

quinta-feira, 7 de maio de 2020

Texto - PONTO SJ



Hoje podem ler-me aqui

E para mim Jesus não foi um feminista da primeira vaga, foi de quarta.No meu entendimento, com os seus ensinamentos essenciais, Jesus diz-nos que uma sociedade que é omissa em Direitos e Igualdade é uma sociedade doente que mata e morre. Uma humanidade doente que mata e morre é o que nos tornaremos se não aprendermos com estas heroínas bíblicas.Curiosamente hoje às mulheres é negada a ordenação sacerdotal pela Igreja Católica. Não há previsão de uma mudança, porque afinal Jesus só teve discípulos homens e, à mesa da última ceia, aquele espaço de sacralidade onde se instituiu para sempre a Eucaristia, só se sentaram homens.  Mas teremos mesmo sido excluídas desse ajuntamento divino? Da última Ceia, a maior das Transformações? Quem, de facto, terá amassado e tornado possível aquele pão?"




terça-feira, 17 de março de 2020

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Dia dos Namorados






Se eu nunca disse que os teus dentes




Se eu nunca disse que os teus dentes
São pérolas,
É porque são dentes.
Se eu nunca disse que os teus lábios
São corais,
É porque são lábios.
Se eu nunca disse que os teus olhos
São d'ónix, ou esmeralda, ou safira,
É porque são olhos.
Pérolas e ónix e corais são coisas,
E coisas não sublimam coisas.
Eu, se algum dia com lugares-comuns
Houvesse de louvar-te,
Decerto buscava na poesia,
Na paisagem, na música,
Imagens transcendentes
Dos olhos e dos lábios e dos dentes.
Mas crê, sinceramente crê,
Que todas as metáforas são pouco
Para dizer o que eu vejo.
E vejo olhos, lábios, dentes.
Reinaldo Ferreira




terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Para ela que nunca vai ler isto





Não sei quando é que nos vamos voltar a ver.
Talvez no teu funeral ou talvez no meu. Ou no de alguém que amamos.

Tens cancro. Estás nos paliativos.

Sabes, acho que, de alguma forma, todos nós estamos.

Não sei bem quem vai primeiro: se tu com essa morte anunciada, se eu a atravessar a rua distraída com o telemóvel na mão. Ninguém sabe. Não há datas marcadas para isto de nos pirarmos daqui para fora.
Obrigada por aquilo que me tens ensinado neste teu anunciado fim consciente: sem dramas, sem lágrimas.

Ontem vi fotos tuas a fazer desporto e a explicar-nos a todos o privilégio de viver.

Tens toda a razão, isto de viver, é um privilégio do caraças.

Namoramos muito, casamos a achar que temos um príncipe mas afinal não era nada disso que precisávamos: nem nós dele, nem ele de nós.

Apanhamos um amor grande e ele mata-nos o peito de desgosto: sem saber como vimos à superfície e percebemos que o nosso coração ainda bate e que respiramos.

Aprendemos que por muito que a pancada seja enorme, não morremos dela.
Se formos inteligentes afogamo-lo, fazemos-lhe um enterro digno - de margaridas nas mãos e vestidas de preto - atiramos-lhe terra para não ser ele a morrer-nos mais.

Não, népias, nunca, nunca mais sentir aquilo.

Viajamos, fazemos amigos, fazemos conhecidos, ajudamos a criar pessoas, criamos ideias, criamos empresas, viajamos mais, encontramos o amor de verdade e depois disso agarramos-lhe a t-shirt à noite como um hábito: para ter a certeza da sua presença na sombra e na luz.

Obrigada por me fazeres ver isso.

Que esta roda gigante em que vivo é um privilégio do caraças. Que é bom demais mesmo quando temos contas e impostos para pagar. Que faz sentido dar parte do que recebemos para ver meninas estudar no outro lado do mundo.

Obrigada pelos bailes de noção e de erro.
Errei tanto, S. Teria feito tudo ao contrário mas acho que cheguei cá em cima onde me esperam.

Se a minha hora vier antes da tua, por favor sabe que eu fui e sou completa e feliz.

Cheguei a esta montanha gigante onde sou feliz a saber a sorte que tenho, a saber aprender a perdoar os outros e a mim. O exercício é diário porque eu sou da ética e não da perfeição.

Não faço ideia se dará para subir um bocadinho mais alto do que isto, mas não faz mal. Que haja ou não tempo, tem sido excepcional.

Ganhei um verdadeiro braço debaixo da asa, parafraseando o Godinho.

O homem que encontrei é de verdade. É genuíno. É o coração bom, gigante e tem os olhos mais bonitos que algum dia vi. Com ele não há mentira e tudo é limpo.
É com ele que pretendo que o meu corpo se torne a casa de alguém.
E também há a Ophelia. Sempre haverá.

Sabes, para mim, mesmo que morras, nunca morreste.



p.s: estou a tentar marcar ir ver-te para dançarmos.

sempre tua,

i.




Do regresso

  porque eu já não sei escrever. -as minhas unhas, os meus dedos, a minha boca já não sabem escrever.   já não sei escrever. -os meus olhos,...