Da confissão
O sentido de voto do meu corpo é agora tutelado por uma entidade externa, um outro corpo adicionado ao meu.
Da pertença
A tua biblioteca com os olhos postos em mim desde que entrei na tua sala, os teus livros a dizerem entre si que nunca me tinham visto
(quem é aquela?)
a prenderem a respiração ao meu toque como se tu fosses o seu único digno proprietário e eu
(uma pequena invasora)
uma pequena invasora que os agarra docemente com as ponta dos dedos
à laia de carícia; alguém feito de carne, pele, ossos e unhas que lhes abre as folhas para os saber por dentro.
(uma pequena invasora)
uma pequena invasora que os agarra docemente com as ponta dos dedos
à laia de carícia; alguém feito de carne, pele, ossos e unhas que lhes abre as folhas para os saber por dentro.
Do Martírio
Explicar ao meu corpo que se podia acalmar e que sobreviveria sem ti se um dia o teu quarto cor de fruta desaparecesse da nossa frente para sempre e os teus olhos nunca tivessem existido
(o medo dos teus olhos a questionarem os meus)
(o medo dos teus olhos a questionarem os meus)
Do sofá preto que fala
Explicar as saudades e a dor no peito. Explicar o verniz ruído na ponta das unhas. Explicar os armários azuis-escuros da tua cozinha. Explicar o teu quadro e aquilo que ele me disse enquanto cozinhavas.
Da galinha doce no meu prato
A galinha morta no meu prato a dizer-se doce ao lado do arroz: cozinhaste-nos aos três enquanto a minha roupa me vestia.
Porque gostava de te ter dito que Deus anda a tentar abordar-te na tua solidão, que ele existe, que não é a brincar. Gostava de te ter dito que ele deve andar a esgueirar-se por detrás das portas do teu T1 Kafkiano, a olhar-te, quieto e tranquilo, observando-te nos teus dias como quem te espera. Gostava de saber esperar por ti. Gostava de ter-te explicado Deus quando íamos no teu carro e o painel eletrónico marcava 111 km/Hora.
(111)
(111, quase uma emergência)
Gostava que gostasses de mim a sério.
Gostava que sim.
Olá Inês. Gostei muito destes poemas e copiei dois para o meu blogue. Espero que concordes.
ResponderEliminarBeijinho
Graça
A galinha morta revive quando tu a comes e é doce o vermelho da hemoglobina que te habita. Teus braços, tuas penas, tuas asas - versos a voarem pelo meu país tropical e selvagem, cavalo de sexo tropical e selvagem a desejar galopar infinitos agarrado em tuas crinas e mergulhado nos desertos dos teus vãos de égua no cio e de deusa que geme e goza, e goza e geme, e geme e goza, ad infinitum
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