terça-feira, 20 de setembro de 2016

Carta Aberta a Gregório Duvivier





Caro Gregório Duvivier,

Há coisas que não podemos deixar incólumes. A sua última crónica fez-me ficar três minutos de olhos colados ao iphone enquanto a lia e relia – ao mesmo tempo que apanhava o metro da linha azul em direcção ao Marquês de Pombal (uma maravilhosa estação de metropolitano em Lisboa, onde cem corpos passam por nós a cada dois minutos) e por pouco saí na estação certa. Fiquei a pensar na sua crónica o dia todo, confesso-lhe.
Tinha de lhe escrever porque apostava a minha mão direita em como aquele texto dirigido a Clarice não foi um golpe básico de marketing para o vosso novo filme: aquele texto cheira à honestidade que o Amor traz, de uma ponta à outra, e deixa qualquer coração humano a precisar de ser desfibrilhado em tempo recorde.
Ri-me muito consigo. Com a “Porta dos Fundos” e com o “Vai que cola” (filme incluído). Quando li o “Desculpe o incómodopreciso falar de Clarice” considerei-o um homem emocionalmente capaz (há tantos deficientes emocionais por aí) e, sobretudo, considerei-o um homem profundamente bonito. Bonito a sério.
Os haters espalharam rapidamente as suas explanações habituais pelas redes sociais contra o texto. Entenda isso como aquilo a que em Portugal chamamos de “ressabianço de uma cambada de mal-amados”: porque o Amor de verdade é um enorme privilégio que não é concedido a todos os terrestres – só a alguns de nós.
Não sei o que temos de fazer para obter este desígnio ou como é que somos seleccionados para o poder sentir, mas sei que quando usamos o mesmo pijama dessa pessoa  para dormir, quando deixamos mensagens escritas com baton no espelho da casa de banho, quando escrevemos cartas de amor diárias, quando comemos do mesmo prato enquanto vemos a nova temporada do “House of Cards” de rajada, quando lhe lambemos a bochecha no meio da rua ou montamos a árvore de Natal juntos a ouvir músicas melosas: Amamos. E saber amar alguém será sempre um privilégio.
Fico com pena que não tenha resultado entre vocês: que a esta hora não estejam juntos com quatro filhos, no mínimo.
O verso que Vinícius escreveu sobre o Amor “que seja eterno enquanto dure” deveria ser emendado para “que seja eterno e dure para sempre”.
Não tive a mesma sorte que o Gregório teve: o meu amor morreu no mar da Costa Rica enquanto fazia mergulho. Não sobrou nada porque a água levou tudo.
Não chorei abraçada a ele, chorei sozinha.
Mas não faz mal. Porque aqui também já não falta nada.
Um abraço,
Inês Leitão




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Entrevista - Alentejo Calling - Rádio Renascença

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