quinta-feira, 2 de agosto de 2018

Nenhuma pedra morre






Para J. que é um salmão







A mão dele tem dois dedos mortos por quem me apaixonei.



Dois dedos  sem vida entre os outros que pulsam e ele a saber aceitá-los e a tê-los como parte de si, como quem tem filhos diferentes sem nada para lhes dar:  ele a continuar a amá-los ali.

(os dedos dele são troncos de árvores mortas mas ele não sabe)


De facto, aquela mão, faz-me amá-lo mais.


Ele disse-me que era um homem de dedos mortos e eu não me importei porque a nossa guerra é outra: a do entendimento.

A pior de todas. A feroz.



Ele também é um salmão: um salmão com uma mão.

É um salmão com uma mão de dedos mortos e pés e uma cabeça que pensa por ela própria e se movimenta por aquilo em que acredita; eu gosto das guelras dele. Gosto de o ver respirar.


Não sei se um dia destes o rio dele o leva.

 Se eu o perder de vista, vou sentar-me aqui a vê-lo ir, acreditando  que nenhum pescador o apanhe e que ele continue, rio acima, de escamas brilhantes, e possa encontrar o que procura.







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