terça-feira, 31 de julho de 2018

Tecido cardiaco




Avó,

Obrigada por teres vindo.

Já sentia a tua presença quando arrumei as malas no comboio, cheirou-me a Mangualde .
Sentei-me e o comboio iniciou a marcha, a hora do retorno.

Ninguém ocupou o lugar do corredor mas quando olhei de repente ali estavas tu: a mulher de lenço e vestido preto. Sentaste e olhaste para mim sem dizer nada.

(porque é que nós nunca falamos quando tu vens?)


Eu voltei a olhar para a janela até desistir da liberdade da paisagem e me render a ti e ao amor imenso que sempre me trazes; deitei-me de braços e meio corpo no teu colo.

Vieste.

Eu precisava de casa e tu vieste.

Vieste até Lisboa a encarolar-me o cabelo com as pontas dos teus dedos e eu adormeci assim.

Acordei com uma menina indiana e a mãe dela a dizerem-me que tinha de sair, era a última paragem.

Tu já tinhas ido. E a mensagem já tinha sido dada.




O nosso amor não é daqui.
O nosso tecido cardíaco também não.

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