terça-feira, 29 de novembro de 2011

Para a minha mãe



(para a minha mãe, que não gosta daquilo que eu escrevo )


Trocava os meus ossos pelos teus
mandava que me cortassem os músculos da boca
ou todos os dedos das mãos.

Trocava os meus ossos pelos teus
pelo cheiro da tua cama
eu tão pequena quando tu saías
e tudo a cheirar a ti
que eras perfume e mãe.

Trocava os meus ossos pelos teus
para poder ouvir vezes sem conta
o meu nome chamado por ti da janela de casa
(como se eu fosse importante e tu não pudesses perder-me)

Trocava as minhas rótulas pelas tuas
pelos teus castigos e pelo teu amor todo.

Trocava os meus ossos pelos teus
os meus joelhos estirados em sangue
para não ouvir os gemidos da tua dor
(ou os receios da tua morte a falarem alto na minha cabeça).

Trocava os meus ossos pelos teus
ou oferecia-te os meus olhos num prato
arrancados por dedos indicadores
cheios de amor.

Trocava as minhas rótulas pelas tuas
retiradas sem o carinho da anestesia local.


Trocava os meus ossos pelos teus
sem eira
nem beira
nem pé de figueira
para que possam  existir sempre orações bonitas
murmuradas por ti.

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Entrevista - Alentejo Calling - Rádio Renascença

  ler aqui:  https://rr.sapo.pt/noticia/pais/2024/09/24/migrantes-ajudam-a-construir-um-alentejo-absolutamente-novo-e-povoado/394895/